Mas o que me fez escrever aqui foi a grande quantidade de dados desencontrados sobre a reprodução de bótias em cativeiro, sobretudo, em aquários, nos sites e livros de aquarismo. Passo agora alguns dados úteis que apurei, sobre a reprodução desses peixes: Primeiro, deve-se ter em conta que grande parte das bótias oferecidas no comércio de peixes era oriunda de seu habitat natural, capturadas e enviadas de avião para o comércio, ainda bem pequenas, como alevinos de 2 a 3 cm, em sua maioria, provenientes do Sudoeste asiático. Países como Tailândia e Indonésia, que exportam esses peixes, proíbem a saída dos maiores de 10 a 15 cm, para que permaneçam reproduzindo na natureza, em seu local de origem. Isso é muito bom. Todavia, a imensa demanda por esse peixe, no mundo inteiro, fez com que criadores profissionais conseguissem reproduzir artificialmente a espécie, aos milhões, por indução hormonal.
Segundo, é relevante encarar outra “artificialidade”, a de um aquário caseiro de pequeno porte (até 200L), para se tentar reproduzir essa espécie. Munidos apenas com luz artificial, plantas de plástico, pedrinhas coloridas, etc., dificilmente se conseguiria reproduzir aí as condições ambientais (clima, temperatura, água, solo, plantas, alimentação, luminosidade, etc) dos riachos e alagados onde vivem as bótias, a ponto de provocar sua reprodução.
Terceiro, estamos falando de muito dinheiro, pois a bótia é um dos peixes mais caros do mercado...não interessa aos produtores exportadores explicar a reprodução desses peixes, pois perderiam valor por alevino, se todos os produzissem. Os melhores estudos sobre bótias, nos EUA e Europa, estariam bem guardados. É uma pena, pois se prefere o lucro a garantir a preservação da espécie.
Quarto, tem gente que acredita que uma bótia de 12cm possa reproduzir. Pelos relatos, somente acima dos 20cm de tamanho, depois de 7 ou 8 anos de vida, esses peixes estariam sexualmente maduros. Realmente, eles crescem muito lentamente.
Quinto, como reproduzir um peixe desses em um aquário caseiro, onde convivem outras dez espécies amazônicas, africanas ou asiáticas, se batendo em um pequeno espaço de 200L? Um amigo questionou-me um dia: “quem sabe se alguma bótia adulta já não reproduziu em aquário, e os ovos foram comidos por um tetra, uma coridora, camarão, ou mesmo pelos pais”? Isso é improvável, pois como nunca restaria nem “um” filhote para contar história, em nenhum aquário até hoje?
Já li um relato de que após a morte de bótias grandes em aquário (o dono colocou substâncias tóxicas em excesso na água, por acidente), notou-se que estavam “cheias de ovas”. Há fotos disso na Web. Ora, isso é possível, mas não quer dizer que iriam desovar esses ovos, que um macho iria fecundá-los e nem que haveria eclosão de alevinos.
Sexto, o único registro de reprodução supostamente conseguida em cativeiro (sem injeção de hormônios) é suspeita, e apareceu na Revista Practical Fishkeeping em fevereiro de 1996, enviada pelo inglês Granville Hammond. Suas informações foram muito econômicas e sem detalhes. Já li na Web que as fotos que ele enviou para provar a desova, eclosão, e filhotes eram falsas, ou seja, ele pegou imagens de um criatório artificial, de um asiático de nome Heok Hee Ng. Há registro de um relato antigo, de 1993, onde se conta um sucesso de reprodução de Bótias Palhaço em aquário caseiro. É de um certo Werner Nowak, e não sei porque foi tão mal divulgado, aqui pelo Brasil, em mais de uma década. A referência exata é: "Nowak W. (1993), The Clown Loach spawned! In: Loiselle P. V. and Pool D., Hobbyist Guide to Catfish and Loaches. Tetra Press, Melle, page 25-26".
Eu já havia lido o suspeito relato de Granville Hammond, mas esse de Nowak eu não sabia. Disse que ele tinha 6 bótias de 15 a 17 cm, em um aquário de 140L (apertado, não?), durante 5 anos. PH= 6,2, DH=2.0, filtro de turfa, e temperatura por volta de 29-30 graus, com bomba de forte correnteza, para imitar os riachos asiáticos. Li também que na época de reproduzir, as bótias comem alimentos "vivos"...isso pode ser peixes menores, camarões, minhocas (o site não diz). Nowak não retirou os adultos após a desova, e afirma que conseguiu 39 alevinos sobrevivessem.
Bem, vamos ao que interessa. Será possível conseguir a reprodução natural das Bótias palhaço, em aquário, e no Brasil? Como obter um ambiente próximo do natural, dos rios e lagos do sudoeste asiático? Com bom senso, acredito não ser impossível reproduzi-las. Lemos na Web que a reprodução de Bótias Palhaço ocorrem já em cativeiro, em criadores na Tailândia. É provável que o método utilizado seja com estimulação por injeção de hormônios. No entanto, essa produção não vale a pena, pois é mais custosa que a simples extração natural.
Muitas regiões do Brasil possuem clima aproximado ao da Tailândia e Sumatra: temperaturas de 22 a 31o C durante o ano, época de chuva e de estiagem (chuvas: novembro até abril, e seca: maio a outubro), sol à vontade, vegetação aquática exuberante, etc. Não vejo problema com as Bótias crescerem até uns 20 cm em águas paradas, para engordar. Entretanto, se elas ficarem sempre aí, podem nunca estar prontas para procriação. Nota-se que na Ásia, elas vivem em rios largos e em riachos de água ácida e não tão claras, com pedras, lama e muita vegetação nas margens. Ou seja, gostam de viver águas correntes, agitadas até, e migram para reproduzir, entre setembro e outubro, quando buscam afluentes e alagados com mais comida. A captura de alevinos naqueles rios, segundo fotos, é feita em locais com presença de pedregulhos e pequenas quedas d´água espumantes. Utilizam-se armadilhas de cano ou bambu furado, por onde entram os filhotes, que depois são recolhidos, puxados por uma corda. O bom é que as grandes Bótias não seriam capturadas. Sabe-se que elas procuram correntezas mais fortes, na época de chuva, para desovar nos esconderijos. É o período de abundância de alimentos de todo tipo, de mais água, espaço, campos alagados, etc. As correntezas espumantes evitam fungos nos ovos, já que há ventilação e oxigênio, pois a água está mais limpa, e permite que os ovos fiquem longe de predadores. Mas bótias não são peixes de piracema, e sim Cobitídeos, e estão mais próximas dos bagres e coridoras do que de salmões ou dourados. Realmente, reproduzir Bótias é um processo de paciência e estrutura, difícil para aquaristas de apartamento, com tanques pequenos. Imagine ter de esperar 7, 8, 10 anos para que seu peixe atinja o tamanho certo e maturidade sexual para procriar.
Se alguém já tentou comprar bótias de 20 ou mais centímetros no mercado de peixes ornamentais, pode ter se decepcionado. Primeiro, por não existir venda de Bótia desse porte. Depois, se encontrou alguma, espantou-se com o preço! E quem tem uma dessas em casa, não vende, pois já criou afeição pelo animal. E seria preciso ao menos umas cinco dessas grandes para ensaiar uma reprodução em cativeiro.
A melhor opção para o criador que deseja tentar procriar bótias é dispor de grandes tanques onde se possa simular o ambiente natural, com um grupo de bótias criadas desde pequenas, para garantir sua saúde. As probabilidades de sucesso crescerão. Espero muito que um dia alguém consiga reproduzir a belíssima Chromobotia macracanthus, e conte para todos como conseguiu. Também desejo, de minha parte, ter ajudado os interessados em reprodução de peixes ornamentais, principalmente da Bótia Palhaço...
Grupo de Bótias saudáveis
