As dez perguntas que geralmente surgem sobre a reprodução de peixes ornamentais em aquários são:
1.Como a espécie reproduz normalmente, na natureza? (põe ovos ou não?, protege a cria ou não?) E em aquário, ela reproduz?
2.Qual o melhor tanque para reproduzir a espécie? (volume, comprimento, profundidade)
3.Qual a melhor água? Ácida? Salina? Clara, escura, parada? Qual o ph?
4.Qual a melhor ambientação? Precisa de plantas? Quais? Muita ou pouca luz? Pedras? Troncos? Tocas? Qual o melhor substrato?
5.Quem é o macho e a fêmea, nessa espécie?
6.Qual a idade mínima de procriação da espécie?
7.Como proteger os ovos e alevinos do ataque dos pais, de outros peixes e dos fungos, no aquário?
8.Com quanto tempo de nascidos os alevinos deverão ser alimentados? (Qual o melhor alimento nessa fase?)
9.Devemos ou não separar os pais dos filhotes?
10.O que fazer com os filhotes que estão crescendo? Tenho onde colocá-los?
Sem dúvidas, é uma grande emoção encontrar minúsculas criaturas nadando no aquário, pela manhã, muitas vezes sem ter certeza de qual espécie elas são. Quem passou por essa experiência sabe do que estou falando. Um amigo aquarista festejou o suposto nascimento de tetras cardinais no seu aquário, para só depois reconhecer que os alevinos não passavam de pequenos Dânios zebra. Coisas do hobby.
Não parece, mas a reprodução em cativeiro de espécies ornamentais é um dos fatores que ditam os preços no mercado de peixes. Ou seja, espécies difíceis de reproduzir, ou que são produzidas apenas em locais distantes terão seu valor elevado. Peixes que qualquer pessoa consiga produzir em casa, como Espadas, Lebistes e Betas comuns possuem menor valor. Outro fator é o preço de espécies extraídas da natureza, que dependendo do local e dos custos do transporte, podem ser baratas, como os Cardinais amazônicos, ou bem caras, como as Bótias-palhaço que chegam da Tailândia e Cingapura. Mas o conhecimento do processo reprodutivo de um peixe não tem apenas valor econômico, com a venda de milhares de filhotes, mas simboliza o controle do próprio ciclo vital de uma espécie.
O criador bem sucedido consegue reproduzir seus peixes normalmente, e dependendo da estrutura e condição de sua criação, chega a atingir um elevado índice de sobrevivência das ninhadas, demonstrando experiência e profissionalismo nesta atividade. No Brasil, tem gente muito experiente que faz um trabalho sério tentando e conseguindo, muitas vezes, reproduzir peixes, sobretudo os mais difíceis de procriar em cativeiro ( p. ex. Cascudos, Kinguios de raça, Polypteros (e outros peixes primitivos), Melanotênias, Lábeos, alguns Ciclídeos, Barbos, Discos raros e até camarões). A maioria dos criadores caseiros, por outro lado, que possui apenas um aquário de pequeno porte com variadas espécies, não verá, normalmente, seus peixes reproduzirem (nem sobreviverem), caso sejam de espécies com níveis de dificuldade de reprodução mediana ou difícil. Ele não saberá tambem que atitudes tomar quando um peixe resolve reproduzir em seu tanque. O que fazer quando há uma superpopulação de peixes nascidos em um aquário? Já vi gente que levou seus novos peixes para soltá-los em lagos e rios próximos, atitude altamente perigosa para a ecologia do local. Outros preferem doá-los a amigos e lojistas, ou vendem o excesso que nasceu. Há ainda quem monte outros aquários para viabilizar sua criação, para ter onde acomodar os novos inquilinos. O problema é que dentro de pouco tempo, será preciso todo um compartimento na casa para abrigar tantos aquários.
O desespero de não saber o que fazer, de não ter onde colocar os pais ou filhotes, a angústia de notar que a cada dia mais alevinos “somem” do tanque, a correria em casa com baldes e bacias são eventos mais que comuns em muitos lares de aquaristas amadores. Um amigo hobista estava muito feliz quando disse que em seu tanque haviam nascido dois Dânios zebra. Ora, “dois” é o número de coitados (ou heróis) que sobreviveram no aquário, já que esta espécie pode produzir mais de uma centena de alevinos em uma única ninhada. Quer dizer que a maioria dos filhotes morreu, devorada pelos pais, por outros peixes ou mesmo nunca chegou a nascer, devido a fungos do tanque.
A ilusão de ganhar dinheiro com a reprodução de peixes já tentou muitos criadores desavisados. O mercado é dominado por grandes produtores e exportadores, sendo quase impossível concorrer com eles em termos de preço. Produzir mil Lebistes ou mil barbos Sumatranos não vai enriquecer nenhum criador caseiro, além do que dá um grande trabalho/custo manter tantos peixes, e isso requer grande estrutura. Pior para o pequeno criador é ter que esperar e sustentar o crescimento dos seus alevinos até o tamanho mínimo de venda, o que pode durar meses, e os custos de transporte, que às vezes ultrapassa o valor dos peixes.
A grande variedade de peixes presentes hoje em dia no mundo do aquarismo torna relevante a problemática de sua reprodução, pois cada família de peixes traz consigo diversos tipos de condições, comportamentos e formas de reprodução.
Já li relatos de pessoas dizendo que para procriar tal espécie bastava “um casal e água”. Ora, isso pode ser necessário, mas não é suficiente para se obter sucesso reprodutivo. De fato, existem basicamente três níveis de dificuldade em reprodução (em cativeiro): fácil, moderado e difícil. Há ainda peixes que não se tem relatos de sucesso em sua reprodução, conforme a lista mais abaixo. Lebistes, Guppies e molinésias, por exemplo, nascem à vontade, em qualquer bacia até. Mas o que dizer do Ituí Cavalo (Apteronotus albifrons) ou do Comedor de Algas chinês (Gyrinocheilus aymonieri)? As coisas começam a complicar. Na realidade, nenhum peixe reproduz facilmente sem condições mínimas para tal. Infelizmente, algumas espécies que nos chegam dificilmente se reproduzem em águas paradas, pois precisam migrar longas distâncias contra a correnteza para amadurecer sexualmente e procriar. São os chamados peixes reofílicos, como os Cruzeiros do Sul, Jaraquis, Chalceus, Matrinchans, Piaus, etc. Também espécies importadas da Ásia, sobretudo, também não se reproduzirão em aquários caseiros, como os Tubarões Bala, os Lábeos e as Bótias, pois suas exigências para reprodução são difíceis em cativeiro (e muitos deles sendo reofílicos também). Outras espécies não reproduzem em aquários por necessitarem de uma mudança de salinidade em sua maturação sexual, ou seja, que na natureza precisam chegar no mar ou perto dele, para reproduzirem. Por exemplo, os Tetraodons (Baiacus), os Góbios, os Monodactilus, os Peixes-Vidro Indianos, os Escatófagos, os bagres das espécies Arius e Jordani e os Tigres Siameses (muitos desses de comportamentos reprodutivos desconhecidos).
A boa notícia é que a maioria dos peixes ornamentais comuns no Brasil podem se reproduzir em pequenos tanques caseiros: Acarás-bandeira, Kinguios, Dânios, tetras, pequenos barbos, Colisas, Betas, ciclídeos, cascudos, entre muitos outros são frequentemente reproduzidos pelos aquaristas.

Segundo algumas fontes, um criador será considerado "expert" em reprodução quando conseguir reproduzir acarás Discos, ou seja, isso indicaria o auge da arte do aquarismo. (Foto: K.Koike 2014)
Quem divulga um dado desse com certeza deve adorar os Discos. Há muitos e muitos peixes que poderíamos considerar verdadeiros "desafios" na arte da reprodução, como Tetras Cardinais, Rodóstomo, Tetra Imperador e do Congo, Rásboras, Lábeos, certos Cascudos, como Dianemas, etc.
Os peixes reproduzem de várias formas: os ovíparos, por exemplo, liberam ovos entre folhas, raízes de aguapé ou depressões do substrato, ou mesmo os deixam soltos na correnteza, e após a fertilização pelos machos, vão gerar centenas de alevinos. Os pais não cuidarão nem dos ovos nem dos filhotes, podendo inclusive alimentar-se deles. É o caso dos tetras, barbos e Kinguios, por exemplo. Outros peixes possuem ovos adesivos, os quais depositam sobre superfícies adequadas, como caule e folhas largas de plantas, troncos ou pedras lisas. É o caso dos cascudos e coridoras em geral, ou dos Acarás-Disco e Bandeira, com a diferença que estes cuidam dos filhotes. Há peixes que fazem ninhos entre o lodo ou no substrato, ou usam bolhas na superfície como ninho, demonstrando grande cuidado com ovos e filhotes, guardando-os na boca ou vigiando-os contra perigos. Falamos dos Betas, Gouramis, e alguns ciclídeos, por exemplo, a Tilápia e seus parentes do Lago Malawi.
Em espécies de aquário vivíparas, como os lebistes, molinésias e espadas a fecundação acontece no interior na fêmea, e os alevinos já nascem nadando, com a forma aproximada à dos pais.
Também é importante montar um aquário de tamanho minimamente compatível com a espécie que se deseja reproduzir, com o sistema bem ciclado, água madura e em excelentes condições.
Vejamos oito regras ou conselhos para se conseguir a reprodução de peixes em aquário, obviamente com espécies passíveis de reprodução em cativeiro.
Primeiro: conseguir artificialmente uma ambientação próxima da que os peixes encontram no seu meio natural. Certo que existem peixes mais exigentes que outros em termos de condições para reproduzir, mas é preciso averiguar a ambientação natural de cada espécie, para facilitar sua procriação. Por exemplo, a condição da água (temperatura, ph, dureza, nitritos, sais, filtragem), profundidade do tanque, comprimento e volume mínimos, tipo de plantas e de substrato, alimentos preferidos, nível de luz, períodos mais apropriados de procriação são alguns elementos básicos para os quais o criador deve estar atento.
Segundo: é preciso estudar a espécie e seu processo reprodutivo, incluindo o seu dimorfismo sexual, pois nem sempre a diferença entre o macho e a fêmea de cada espécie é notória. Qual seu comportamento durante a procriação? Qual o tipo de reprodução? Cuida da cria ou não?
Terceiro: o melhor é ter um local próprio de reprodução, um tanque já curtido e bem preparado para receber o casal (ou casais), conforme já foi dito, e não um tanque comunitário. Detalhe importante: a área (horizontal) é mais importante que a profundidade, para a grande maioria dos peixes de aquário. Quer dizer que, podendo, priorize o espelho d´água, e com uma região mais "rasa" (tipo 15-30cm). Na natureza, muitas espécies buscam locais rasos e sem presença de outros peixes (local calmo, retirado e despovoado), com plantas imersas e emersas, além de vegetação ribeirinha, como capim, juncos, ramos, na hora de reproduzir. Os pais desovam, e saem dali. Os alevinos vão nascer, e poder crescer, quase sem ser incomodados e devorados. Em aquário, pode-se fazer tufos artificiais, mas dependendo da espécie, tira-se os pais, pois no mesmo ambiente, terminam comendo os ovos e filhotes. Por isso, a maioria dos piscicultores trabalham com tanques estilo lagos, com vegetação, se querem reproduzir peixes. No caso de aquários, é bom atentar para o local do tanque, um lugar sem muito movimento ou barulho externos, para evitar estressar os peixes.
Quarto: a escolha de indivíduos saudáveis e maduros é outro dado importante para o sucesso da procriação pretendida. Tamanho, idade e aspecto saudável são pontos que devem ser observados entre os peixes que se pretende reproduzir.
Quinto: se não puder vigiar 24 horas por dia o momento da procriação, é essencial fazer com que os ovos e alevinos estejam protegidos de ataques dos próprios pais ou de outros peixes. Assim, pode-se tornar a vegetação mais densa, colocar pedregulhos ou bolas de gude para que os ovos soltos caiam entre eles, redes grossas para os ovos passarem para o fundo, mas não peixes maiores, colocar certos tipos de berçários, para que os filhotes não sejam devorados, etc. Uma receita comum, mas não 100% eficaz é a retirada dos pais do tanque assim que notar ovos ou alevinos. O problema é que havendo muitos casais, as desovas podem durar dias, mesmo após o nascimento de alguns filhotes. Como saber quais pais retirar? Na natureza, os filhotes procuram instintivamente o abrigo de plantas (como as flutuantes ou hidrófilas) ou ainda buscam locais mais rasos, para se proteger dos peixes predadores maiores (contudo, serão devorados por aves e insetos invertebrados aquáticos).
Sexto: o maior inimigo da reprodução em aquário é a existência de fungos e algas no recinto, que prejudicarão o desenvolvimento dos ovos. Por isso é que os acarás-discos abanam tanto seus ninhos, pois ao mesmo tempo em que oxigenam o local, evitam os fungos. O melhor a fazer contra isso é estar sempre vigilante contra algas maléficas, e manter uma excelente filtragem e circulação da água, bem como frequentes trocas parciais com boa água.
Sétimo: muitos conseguem a reprodução, mas terminam perdendo a ninhada por ignorar as formas de alimentação dos alevinos ou por retirar os peixes pequenos demais, para locais às vezes inadequados. Nas primeiras horas de nascido, os peixes não precisarão de comida, nem podem tomar sol diretamente, por sua fragilidade. Também é preciso diminuir a movimentação da água, para algumas espécies, e evitar que os pequenos sejam sugados para o filtro. Também, é útil ter no aquário locais de abrigo para os alevinos, como muitas plantas em tufos, ou flutuantes, para evitar serem todos comidos. Observe se a espécie que reproduziu protege as crias ou não. Se não, o indicado é retirar os pais assim que notar os ovos. Nos dias seguintes à eclosão, é preciso fornecer alimento para os pequenos, como os plânctons de infusórios, pó de peixe (ração bem esfarelada), gema de ovo (pouco), rações apropriadas para alevinos, etc. Se for retirar os alevinos para outro tanque, observe se os parâmetros da água são os mesmo (o melhor é colocá-los na mesma água do aquário onde nasceram, para evitar problemas de algum choque).
Oitavo: Separar os pais dos filhotes, ou não? Claro, em locais pequenos como aquários, a chance dos pais devorarem os ovos e filhotes se multiplica. Portanto, ou se retira os pais, ou deixa-se o ambiente propício para os filhotes (ou sua maior parte) sobreviverem, seja com plantas, tocas, pedras, troncos, etc. As plantas são o melhor meio para os pequenos viverem. Para tal, o aquário deve estar quase sem espaço para nado, e com variadas espécies de plantas. No caso de precisar separar pais e filhotes, o melhor é DEIXAR os filhotes no tanque onde nasceram e retirar seus pais....pois os pequenos não suportam mudanças de parâmetros e ambiente ainda. Mas é lógico que separar pais que cuidam das crias é morte certa para os alevinos. Por exemplo, os Discos, alguns Cascudos e Ciclídeos, entre outras espécies, cuidam das crias e lhes fornecem alimentação na época crítica após o nascimento.
Por fim, é preciso ter a consciência e a responsabilidade com a procriação de uma espécie, e estar ciente de que a reprodução de peixes não pode ser vista como acidente ou coincidência, e sim um dos mais importantes processos vitais de qualquer animal. E o criador que domina plenamente o processo reprodutivo de várias espécies de peixes, e consegue que seus filhotes cresçam saudáveis, seguramente demonstra maturidade na prática do aquarismo.
Por fim, como prometido, a lista de peixes que NÃO vemos normalmente reproduzir ou cuja reprodução é desconhecida em aquários caseiros:
Abelhinha
Abramites
Anóstomus
Bagre Jordani (Peixe Gato Colombiano)
Baiacus (Tetraodons)
Balashark ou Tubarão Bala
Barbo Schwanenfeldi
Bótia (Palhaço, Modesta, Mármore, etc.)
Cascudo Dianema
Cascudo Zebra
Chalceus
Chilodus
Curimata Spilura
Cobrinha Kuhli
Comedor de Alga (Chinês e Siamês)
Cruzeiro do Sul
Distichodus
Dojo
Gato de Vidro
Gato Invertido Asiático (Negro) (Mystus Leucophasis)
Ituí Cavalo
Jacundá
Labeos (Negro, Bicolor, Frenatus)
Neón
Peixe Borboleta
Piau Flamengo (Leporinus)
Pimelodus Pictus
Rásbora Arlequim
Tetra Cardinal
Tetra Imperador
Tuvira (Gymnotus carapo)
Caso alguém saiba de algum caso de sucesso de reprodução (confiável) dessas espécies em aquário, favor divulgar, de preferência com fotos ou fontes reconhecidas.

Plantas são importantes, na hora da reprodução, pois fornecem abrigo e conforto aos peixes (Foto: K.Koike 2013)